Texto para a Espiritualidade Afro | Autor:
Reinaldo João de Oliveira
“Na vida, no caminho, na
religião, tudo tem uma razão, uma lição. Até mesmo o que está dando errado.”
Precisamos
viver no espírito, uma reconstrução de nós mesmos. Mas, o Espírito que nos guia
tem o poder de nos transformar? Claro que sim, e possuímos uma base que se
constitui nas experiências e Sabedorias ancestrais AfroAmeríndias: a luz desse
Espírito que brilha em nossa realidade nos desafia!
Vivemos
em contextos muito diversos, num mundo com rápidas mudanças e impactos destruidores
nas condições de vida da humanidade no planeta. Particularmente o nosso Povo
vive em condições desumanas de Submoradia, Subnutrição, Subemprego...
Precisamos de método para seguir:
No espírito do ver: é necessário ter uma
visão aberta para acolher o que o nosso espírito interior e integrador nos diz,
inspirando novos e diferentes posicionamentos na busca para uma cultura da
vida. Precisamos ter atitude de respeito e reciprocidade com todas as demais
pessoas e seres, com o universo.
Poucos
conseguem compreender o sentido da missão dos nossos Profetas e Mártires: ao
fazerem a experiência mística de Javé, descobrem a sacralidade da Terra e
percebem que Deus vê, escuta, conhece e se aproxima do povo oprimido. Assim, em
nome de Deus libertador, esses/as que souberam ver a vida dos nossos ancestrais
escravizados/as, se organizam para construir vida digna para todos. Vendo e sonhando
juntos, conseguiremos atravessar as dificuldades e vencer.
No espírito do julgar: o que implica em nova
postura que exige rupturas, ou seja, rompimento com sistemas e esquemas mentais
dominantes para ultrapassarmos para o outro lado, a “Terra sem Males”: fazer
disso um projeto de vida! Julgar implica ter consciência da justiça para promover
a vida onde não há, para que não haja mais explorados e escravizados, nem
exploradores. Assim, devemos perseguir o sonho e a crença na caminhada do povo em
busca de dignidade e autonomia, coletivamente.
Para
isso, é essencial uma inspiração bíblica com a revelação do sonho que gerou o
Êxodo (Ex 15,2-21). Quando a esperança é forte, ela engravida a história. Nestas
circunstâncias, animados pelo desejo de libertação e pela presença do Deus
libertador que escuta o clamor do nosso povo (Ex 3,7-10).
No espírito do agir: agindo com a prática e
inspiração bíblica, continuamos a caminhada, com a fé, ousadia e coragem dos
escolhidos por Jesus, para o Reino de Deus que sofre ação violenta: “desde os
dias de João, o Batista, até agora, o reino dos céus sofre violência...” (Mt.
11,12), e entraremos nele!
Jesus nos
inspira, pois conheceu na sua carne o significado da violência, na dor, nos
sofrimentos. E, assim como o Mestre, somos vítimas da opressão, junto a quem
luta pela causa da justiça. Todo este caminho é libertador, pois carrega a
solidariedade transgressora, particularmente das mulheres (Ex 1,15-22). Assim
foi na ação da mãe e da irmã de Moisés (Ex 2,1-4). Depois, a ação e a fé na
salvação, vinda com as primas Izabel e Maria e seus filhos João Batista e Jesus
de Nazaré (a salvação da morte prematura dos nascidos e capacitados para
liderar o povo, na travessia da escravidão para a liberdade).
No espírito do celebrar: ansiando a luta contra a
opressão, o sentido da celebração (Ex 15,19-21)! Celebrar é preciso, mas só não
basta! Antes, o povo precisa sair do Egito, da terra da escravidão. Na
celebração está o sentido da memória de todos os que lutaram e de quem hoje
luta para construir um futuro. Na celebração está implícito o caminhar pelo
deserto e a confiança na força de Javé, no projeto de autonomia, liberdade e vida
com dignidade para todos!
O resgate
desta memória do êxodo bíblico pode ajudar-nos a superar a tentação do “ter”, a
ganância e a ambição desmedida de acumular ou de consumir. O texto de Êxodo
16,16-18 pergunta-nos se somos capazes de partilhar bens, saberes, dons; se
aceitamos aprender algo das antigas sabedorias afroameríndias; se somos capazes
de vivenciar a experiência sagrada de dialogar e de comer juntos; se estamos
dispostos a recuperar a dignidade da nossa espécie, do nosso povo, como Povo de
Deus.
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Este espaço busca ser um lugar de interação com contribuições em temas relacionados às Culturas Afroameríndias, suas diversas manifestações e contextos. Nos campos de exposição, apresento em forma de reflexões alguns textos sociais, históricos, políticos, teológico-religiosos e educativos. Também o universo das artes e literaturas são outras referências, leituras e aprofundamentos, conforme este processo de interlocução dialógica em construção.
Agradeço-lhe pelo interesse em reconhecimento e atenção ao nosso trabalho!
Atenciosamente,
Reinaldo.