Embora as teologias (afro-americana, índia, feminista) tenham suas temáticas específicas, por razões óbvias, é fundamental que haja um diálogo, mais que isto, uma implicação com a teologia convencional utilizada pelo magistério das igrejas, elaborada pelos teólogos clássicos, e ensinada nos institutos de teologia. Bem entendida, esta relação poderá ser reciprocamente proveitosa.
Na ótica da inculturação da teologia, a experiência emergente nas comunidades negras questiona a formalidade e o alcance das áreas teológicas desde a reflexão bíblica até a pastoral.
Inculturação e Bíblia
A maneira como os biblistas latino-americanos têm utilizado a Bíblia tem sido de grande significado e interesse para a comunidade negra. Sobretudo pelo fato de poder reconhecer-se, ao menos em parte, nesta original hermenêutica bíblica. Entretanto, percebe-se que não é o suficiente. É preciso assumir os mitos cosmogônicos próprios dos povos afro-americanos, seus provérbios, suas histórias orais e perceber desde aí a original manifestação de Deus. É preciso descobrir a Bíblia do povo negro, com suas propostas humanitárias, com os relatos dos sofrimentos e resistências em situação de diáspora e de cativeiro.
Inculturação e Revelação
Por certo que a revelação para a fé cristã está plenificada no Cristo. Entretanto é necessário continuar desvelando as multiformes manifestações de Deus como caminhos e etapas originais, onde cada povo e cultura buscam o sentido último de todas as coisas. Deus mulher, Deus índio, Deus negro. Este Deus multifacetário caracteriza-se como Deus da vida.
Inculturação e Ética
Ocorre não só refletir a moral enquanto atos isolados, mas sobretudo avaliar os processos à luz do princípio ético. Sem cair em privacionismos, é fundamental que as práticas sejam analisadas em seus contextos e sob o facho de luz da utopia humanizante.
Inculturação e Sistemática
A maneira como os tratados teológicos estão organizados e propostos, não é aleatória; traz embutida uma intencionalidade. Inclusive os pressupostos desta sistematização, no que diz respeito ao instrumental filosófico, por exemplo, já direcionam para determinados objetivos. Na perspectiva da inculturação da teologia, implica numa transformação profunda da linguagem e do método teológico.
Inculturação e Eclesiologia
Na área da eclesiologia as exigências da inculturação da teologia são particularmente desafiadoras. É preciso, por exemplo, ir além das notas da igreja católica e recuperar a dimensão universal da catolicidade. Atitude semelhante deve ocorrer nas demais igrejas cristãs. Igualmente é preciso firmar cada vez mais a circularidade própria de uma igreja ministerial, de comunhão e de participação. Entender "ecclesia" não como dimensão formal e estranha às organizações emergentes, mas a partir das relações de serviços vigentes nas culturas.
Participantes da Oficina, que contribuíram para esta reflexão (consulta):
Marcos Rodrigues Da Silva (Coord.); Afonso Mª Ligório Soares; Antônio Aparecido da Silva; Blanca Irma Clarke; Eleazar López Hernández; Jacquelyn Grant; Luiz Fernando de Oliveira
Sistematização da mesma (a partir dos estudos e referências): Reinaldo João de Oliveira
A modo de conclusão desta pesquisa, visando “avançar na reflexão”
A população afro-brasileira e indígena resiste aos racismos e preconceitos ao longo dos 500 anos já transcorridos. Hoje estes povos foram adentrando as instituições sociais do país, outrora majoritariamente, ou, exclusivamente composta por um grupo de pessoas que sequer legislava para com a causa negra ou indígena, dadas as conseqüências presentes na sociedade latino-americana, especialmente no Brasil, último país a abolir a escravidão. Referimo-nos desta forma porque, estas instituições, construídas a partir de uma hierarquia conservadora que, apoiando-se em princípios etnocêntricos, numa antropologia evolucionista, excluíram das instâncias de poder a participação do(a) negro(a) e do indígena. Portanto, o que sentimos, no momento atual, são as conseqüências da formatação de uma estrutura social cuja elite dominante nunca aceitou que os(as) negros(as) e indígenas tivessem acesso aos direitos individuais, civis, sociais e políticos.
Contudo, se, por um lado, graças às lutas incansáveis do movimento negro e das comunidades indígenas, alcançamos várias conquistas e uma consciência cidadã ativa; por outro, somente atingiremos a cidadania completa quando, de fato, a população afro-brasileira e indígena for reconhecida como detentora do direito que sempre, na história, lhe foi tirada. Para assim, poder atuar e viver com plena participação tanto nas decisões políticas como nas riquezas do país. E a hora é esta. Por isso não podemos perder o processo histórico. Pois é chegado o momento através do qual saberemos quem, realmente, quer construir um Brasil igual, onde todos, brancos e negros, tenham os mesmos direitos iguais, como assegura a Carta Magna da nação. E, sem dúvida, que isso tudo passa pelo processo teológico e pastoral como ortopráxis, ação ativa e pensada partindo destes contextos, sem excluir, o que nos apresenta a realidade na qual estamos inseridos.
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Este espaço busca ser um lugar de interação com contribuições em temas relacionados às Culturas Afroameríndias, suas diversas manifestações e contextos. Nos campos de exposição, apresento em forma de reflexões alguns textos sociais, históricos, políticos, teológico-religiosos e educativos. Também o universo das artes e literaturas são outras referências, leituras e aprofundamentos, conforme este processo de interlocução dialógica em construção.
Agradeço-lhe pelo interesse em reconhecimento e atenção ao nosso trabalho!
Atenciosamente,
Reinaldo.