quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

O OBJETIVO DESTA REFLEXÃO: fazer um recorte teórico...


Partindo de que o nosso objetivo seria “fazer o recorte teórico do que seria um ensaio de linguagem teológica determinada pela racionalidade imagética, metafórica e narrativa própria à cultura afroamericana”, como um situar-se dentro do mundo.


Já neste situar-se, o movimento de resistência pelo pensar teológico afro-americano, afrobrasileiro, afro-ameríndio, buscou-se ter sua autonomia reconhecida, divulgada (nem tanto), mas realmente respeitada e, mais que isso, valorizada por suas fortes manifestações que estão impregnadas de cultura, da religiosidade e, por tudo isso, da fé. Hoje esta busca continua, e não é diferente das décadas e dos contextos (sociais, políticos, religiosos, históricos) – Apenas o que percebemos é uma construção conjunta pela “identidade” da
reflexão.

Trazendo de volta uma análise sobre o modo como pensamos o nosso pensamento hermenêutico-teológico, um reconhecido grupo de teólogos e teólogas Afro-brasileiros (as), na década de 90, produziu um “pensar teológico contextual, aberto às provocações que fizemos neste pequeno relato sobre o percurso da nossa reflexão atual”10. E que, além destes questionamentos, trazem consigo outros tantos para refletirmos hoje. É, por isso que preocupa-nos, antes de tudo: - Para onde caminhamos? E, “por onde começamos a pensar sobre o pensamento teológico negro”? E, por que refletirmos a partir deste viés?

Este pensar hermenêutico, se é que ele exista, já que nos perguntamos por sua existência, é um pensamento de quem é, por definição, negro/a, afro? Ou, mais ainda: é um Pensamento teológico contextualmente negro, afro-latinoamericano, de fato?11 Talvez alguns se perguntem: - Por que o negro, o afro, quer saber de pensar teologia? Certamente seria óbvio que “dentro” do situar-se teológico contextual seria praxe pensar que este ou aquela pensasse sobre si mesmo(a). Mas, ainda não satisfeitos os acadêmicos perguntariam: Já não bastaria pensar a história, como memória, ou correção; ou pensar a partir das ciências sociais, como reivindicação ou “reparação”; ou analisar através das Ciências Humanas ou as Ciências Religiosas, e ainda quem sabe em particular a Antropologia, como pergunta sobre sua origem cultural; ou como contribuição à pesquisa científica, e a Psicologia como uma análise mais voltada à psique ou à alma como afirmação de uma identidade afro?12

Acreditamos que isso vem sendo feito apesar das resistências. Contudo, ao querermos mexer num “departamento” quase que exclusivista, do ponto de vista prático ou formal, como já criticava outros autores ao negar o estatuto de ciência para a Teologia, cabe perguntar neste caso se as intencionalidades coíbem ainda o pensar livre13. Talvez isso esteja superado pela ciência tal como a concebamos. No entanto, ainda bastaria olhar para as academias que lecionam a Teologia e perguntar: Onde se reflete teologia afro-indígena? Como se reflete? O que se fala sobre teologia Afro? E ainda: Por quem? Quem são os sujeitos do saber teológico negro, afro, no mundo, na história da Teologia, na história das Religiões? Não queremos dizer aqui que deva-se mudar a abordagem teológica por quem já esteja refletindo nas academias, mas acreditamos ser necessário uma avaliação e uma retomada histórica primordial resguardando a fé e os sentidos para além de uma inculturação teológica e hermenêutica.

Sentimos que se devam valorizar e empoderar os povos e as culturas a partir do diálogo e da abertura para eles se encontrarem como “ser” para o mundo, para os outros e para si mesmos, na interação livre e respeitosa de seus valores. Querendo, com isso, provocar ou recordar de um dos “gritos” deste tipo na América Latina, relatado no livro Teología Negra / teologia de la liberación, organizado por Paulo Freire, Hugo Assman, Eduardo I. Bodipo-Malumba e James H. Kone14, no início da década de 70, abrimos o campo da reflexão para discutir a dimensão de “africanidade”, ou “africanização da teologia” nos nossos momentos, nas nossas academias, nos nossos grupos socialmente constituídos.

Numa reflexão intitulada por “Diálogo – Incomunicación”, Eduardo I. Bodipo Malumba se apresenta com o seguinte discurso para uma platéia, acerca da teologia negra (ou africana), neste mesmo evento que “gestou” depois o livro supracitado. Traduzindo o texto, que se encontra no espanhol, eis a fala de Bodipo:

Está comprovado que a diferença básica que existe entre nossos padrões de pensamento é que vocês – e quando digo vocês refiro-me ao auditório ocidental que se encontra aqui – seguem um caminho estritamente determinista, enquanto que nossa interpretação da teologia e do papel que o homem desempenha na história se encontra enraizada em uma dialética que é puramente negra e sinceramente africana. Atualmente, parece que o oeste pretende defender a liberdade para si e também para nós. Considera-se protagonista da causa da liberdade e interlocutor do resto do mundo. O ocidente acredita que herdou uma metafísica do ser que não pode construir coerentemente a liberdade. Esta é a diferença básica que existe entre nós. Somente fazendo um esforço para a convergência poderíamos chegar a entendermo-nos mutuamente. Mas de momento somos dois mundos separados.15

Nota-se que Eduardo Bodipo abriu caminhos não somente para se pensar um outro tipo de hermenêutica, teologia, ou o que quer que venhamos perguntar, como também procura questionar uma outra “metafísica” que não seja determinista e ocidental, mas africana, negra. E, neste movimento, poderíamos nos perguntar se essa corrente também não nos levaria a uma outra “lógica” que não à que estamos habituados a “ver” em nossos programas e “conteúdos disciplinares”?


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Este espaço busca ser um lugar de interação com contribuições em temas relacionados às Culturas Afroameríndias, suas diversas manifestações e contextos. Nos campos de exposição, apresento em forma de reflexões alguns textos sociais, históricos, políticos, teológico-religiosos e educativos. Também o universo das artes e literaturas são outras referências, leituras e aprofundamentos, conforme este processo de interlocução dialógica em construção.
Agradeço-lhe pelo interesse em reconhecimento e atenção ao nosso trabalho!

Atenciosamente,
Reinaldo.

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